Sex, 22 de Fevereiro de 2013 10:05 por: cnbb
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá
Bispo de Macapá
Um rio, na sua tranquila corrida para o
mar, chegou em um deserto e parou. Diante de si, tinha somente pedras
espalhadas por todo lugar e dunas de areia a perder de vista. Ficou paralisado
pelo medo. – É o meu fim – pensou desesperado – nunca vou conseguir atravessar
este deserto. A areia vai engolir a minha água e eu vou desaparecer. Nunca mais
chegarei ao mar. Sou um rio fracassado.
Aos poucos as suas águas começaram a
ficar sujas. O rio estava virando lama e estava morrendo. O vento, porém, tinha
ouvido as suas lamúrias e decidiu salvar-lhe a vida.
– Não tenhas medo, deixa que o sol te
esquente. Tu vais subir ao céu na forma de vapor. Depois eu mesmo pensarei o
restante.
Mas o medo do rio aumentava:
- Eu não sou feito para voar nos ares,
eu devo correr entre as margens, líquido e majestoso.
O vento insistiu e explicou:
- Quando chegares ao céu, vais te
transformar numa nuvem. Eu te levarei além do deserto e tu poderás cair
novamente sobre a terra, na forma de chuva, vais voltar a ser rio e vais chegar
ao mar.
O rio, porém, teve mais medo ainda.
Assim foi devorado pelo deserto.
Podemos dizer isso de muitas formas,
mas a nossa vida é feita de contínuas transformações. Somos sempre a mesma pessoa,
mas também mudamos. As etapas da vida nos fazem passar pela infância, pela
juventude, pela idade adulta e, enfim, pela velhice. Os traços pessoais
permanecem, no entanto, às vezes, mudamos tanto que ficamos quase
irreconhecíveis. As maiores transformações, porém, não são as do nosso corpo.
Mudamos muito mais nas ideias, nos afetos, nos pensamentos, nos sonhos e nas
esperanças. O ser humano vive em transformação. É por isso que queremos saber
de onde viemos e para onde vamos.
Se a vida é um caminho, para onde nos
conduz? Podemos encontrar as respostas escutando o que o Filho, Jesus, nos diz,
dando ouvido e acreditando na voz do Pai que o enviou. A missão de Jesus foi a
de nos fazer conhecer o amor do Pai. Ele quis reconduzir a humanidade ao
encontro com Deus, numa nova aliança de amor. Deu atenção aos mais afastados,
aos mais sofridos, buscou as ovelhas perdidas. Desmascarou uma religiosidade
hipócrita feita de rigor exterior e sem coração. Perdoou e não condenou os
pecadores. Entregou totalmente a sua vida a esta missão e pagou muito caro por
tudo isso: foi morto na cruz. No entanto abriu o único caminho possível para a
verdadeira transformação da vida pessoal de cada ser humano e do mundo inteiro:
o caminho do amor. Os apóstolos começaram a entender tudo isso somente na manhã
radiosa da Páscoa e ao anoitecer daquele dia quando o reencontraram
ressuscitado.
Cada um de nós é chamado a dar um
sentido às transformações que acontecem em sua vida. Cada etapa é o fim de
algo, mas pode ser também um novo começo. Vale também para os acontecimentos da
vida. Alguns são esperados e preparados, outros nos pegam de surpresa e devemos
reaprender a conviver com a nova situação. Tudo, em nossa vida, poderia – ou
deveria – servir para nos tornar melhores. Mais capazes de amar e sofrer; mais
capazes de doar e aceitar ser ajudados; mais capazes de confiar e ser
confiáveis. Mais corajosos na fé, mais firmes na esperança e mais generosos no
amor. Mais felizes. Nem sempre isso acontece. Muitas vezes mudamos para pior.
Ficamos mais egoístas, interesseiros, vingativos e rabugentos. Sempre mais
tristes e perdidos. É porque deixamos de prestar atenção e acreditar naquilo
que Jesus fez e ensinou. O caminho para a vida nova da ressurreição passa pela
subida ao Calvário, tem que morrer um pouco todo dia ao nosso orgulho para
deixar a paz do Senhor tomar conta do nosso coração. “Somos cidadãos do céu”
nos lembra a carta aos Filipenses neste domingo.
Somos rios que devem correr para o mar,
de transformação em transformação. Não somos feito para morrer nos desertos da
vida.
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