Qua, 20 de Fevereiro de 2013 17:03 por: cnbb
Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues
Arcebispo de Sorocaba (SP)
Arcebispo de Sorocaba (SP)
O Credo cristão começa assim : “Creio
em Deus Pai todo poderoso, criador do céu e da terra”. A crise de fé
começa aqui e levanta as seguintes perguntas: o que é crer? Por que crer em
Deus? Quem é Deus? O Universo tem sua origem em um ato de poder de um ser
transcendente ou é fruto do acaso? Não será a idéia de Deus uma criação da
mente humana para preencher as lacunas do conhecimento humano sempre limitado?
Crer em Deus não é mergulhar numa ilusão perigosa - uma alienação - por delegar
a outro a direção da história? A resposta às perguntas que emergem do desejo de
saber do ser humano não devem encontrar respostas na própria razão? E ainda:
como explicar a presença do mal no mundo?
Dois fenômenos desafiam hoje a fé
cristã em Deus: de um lado, o ateísmo, e , de outro, certas concepções de Deus
que acabam por negar sua relação pessoal com o ser humano e com sua história. A
fé Cristã crê em um Deus que se faz homem e participa de nossa história.
O Concílio Vaticano II, ao tratar da
dignidade da pessoa humana, na Constituição Pastoral “Gaudium et Spes”, dedicou
uma significativa reflexão à questão do ateísmo. Cinquenta ano após sua
abertura, seus ensinamentos continuam atuais.
Retomo algumas afirmações do Concílio
para oferecer ao leitor sua posição sobre o ateísmo. Já na introdução afirma o
documento: “Por fim, as novas circunstâncias afetam a própria vida religiosa.
Por um lado, um sentido crítico mais apurado purifica-a duma concepção mágica do
mundo e de certas sobrevivências supersticiosas, e exige cada dia mais a adesão
a uma fé pessoal e operante; desta maneira, muitos chegam a um mais vivo
sentido de Deus. Mas, por outro lado, grandes massas afastam-se praticamente da
religião.
Ao contrário do que sucedia em tempos
passados, negar Deus ou a religião, ou prescindir deles já não é um fato
individual e insólito: hoje, com efeito, isso é muitas vezes apresentado como
exigência do progresso científico ou dum novo tipo de humanismo. Em muitas regiões,
tudo isto não é apenas afirmado no meio filosófico, mas invade em larga escala
a literatura, a arte, a interpretação das ciências do homem e da história e até
as próprias leis civis; o que provoca a desorientação de muitos”(GS 7). Mas é
no capítulo primeiro da primeira parte que a questão do ateismo é
abordada de forma direta e explícita em quatro ítens: 1. Formas e causas do
ateismo (n. 19); 2. O ateismo sitemático (n. 20); 3. Atitude da Igreja diante
do ateismo (n. 21); 4. Cristo, o homem novo (n. 22).
Como o ítem 1 sugere, “com a palavra
‘ateismo’designam-se fenômenos muito diversos entre si. Com efeito, enquanto
alguns negam expressamente Deus, outros pensam que o homem não pode afirmar
seja o que for a seu respeito; outros ainda, tratam o problema de Deus de tal
maneira que ele parece não ter significado.
Muitos, ultrapassando indevidamente os limites das ciências positivas, ou pretendem explicar todas as coisas só com os recursos da ciência, ou, pelo contrário, já não admitem nenhuma verdade absoluta. Alguns, exaltam de tal modo o homem, que a fé em Deus perde toda a força, e parecem mais inclinados a afirmar o homem do que a negar Deus. Outros, concebem Deus de uma tal maneira, que aquilo que rejeitam não é de modo algum o Deus do Evangelho. Outros há que nem sequer abordam o problema de Deus: parecem alheios a qualquer inquietação religiosa e não percebem por que se devem ainda preocupar com a religião.
Muitos, ultrapassando indevidamente os limites das ciências positivas, ou pretendem explicar todas as coisas só com os recursos da ciência, ou, pelo contrário, já não admitem nenhuma verdade absoluta. Alguns, exaltam de tal modo o homem, que a fé em Deus perde toda a força, e parecem mais inclinados a afirmar o homem do que a negar Deus. Outros, concebem Deus de uma tal maneira, que aquilo que rejeitam não é de modo algum o Deus do Evangelho. Outros há que nem sequer abordam o problema de Deus: parecem alheios a qualquer inquietação religiosa e não percebem por que se devem ainda preocupar com a religião.
Além disso, o ateísmo nasce muitas
vezes dum protesto violento contra o mal que existe no mundo, ou de se ter
atribuído indevidamente o caráter de absoluto a certos valores humanos que
passam a ocupar o lugar de Deus. A própria civilização atual, não por si mesma,
mas pelo fato de estar muito ligada com as realidades terrestres, torna muitas
vezes mais difícil o acesso a Deus”(GS 19).
No final desse número o Concílio faz
uma afirmação que questiona profundamente a nós cristãqos. Ei-la: “o
ateísmo, considerado no seu conjunto, não é um fenômeno originário, antes
resulta de várias causas, entre as quais se conta também a reação crítica
contra as religiões e, nalguns países, principalmente contra a religião cristã.
Pelo que os crentes podem ter tido parte não pequena na gênese do ateísmo, na
medida em que, pela negligência na educação da sua fé, ou por exposições
falaciosas da doutrina, ou ainda pelas deficiências da sua vida religiosa,
moral e social, se pode dizer que antes esconderam do que revelaram o autêntico
rosto de Deus e da religião.”( GS 19).
Essa afirmação do Concílio nos chama à
responsabilidade diante do ateismo em suas variadas formas. Inevitável não
recordar a advertência da epístola de Tiago: “Tu tens a fé, e eu tenho obras!
Mostra-me a tua fé sem as obras, que eu te mostrarei a minha fé a partir de
minhas obras! Tu crês que há um só Deus? Fazes bem! Mas também os
demônios crêem isso, e estremecem de medo. Queres então saber, homem
fútil, como a fé que não se traduz em obras é vã?”(Tg 1,18-20). (continua)
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