Sex, 15 de Fevereiro de 2013 13:09 por: cnbb
Dom Redovino
Rizzardo
Bispo de Dourados (MS)
Bispo de Dourados (MS)
«Depois de ter
examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza
de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idôneas para
exercer adequadamente o ministério petrino. Estou bem consciente de que este
ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras
e com as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando.
Todavia, no
mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande
relevância para a vida da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o
Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor
este que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim, que preciso
reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi
confiado».
Foi com essas palavras que, no dia 11
de fevereiro, durante uma reunião com os cardeais da Cúria romana, o Papa Bento
XVI anunciou a sua renúncia ao pontificado.
Fazia tempo que ele pensava no assunto.
Em 2010, na entrevista que concedeu ao jornalista Peter Seewald, fora claro: «Quando a dificuldade é grande, não se pode fugir e dizer: "Que
outro se ocupe disso!”. Mas, se um papa percebe que já não tem condições
físicas, mentais e espirituais para levar adiante as obrigações de seu cargo,
tem o direito e, em algumas circunstâncias, o dever de se demitir».
Apesar de não ser novidade na Igreja,
seu ato provocou perplexidades. A história lembra outros papas que renunciaram
ou foram obrigados a fazê-lo: São Clemente (88/97), condenado ao exílio pelo
imperador Domiciano, passou o cargo a Santo Evaristo; São Ponciano (230/235),
desterrado pelo imperador Severo, deixou o lugar para Santo Antero; São
Silvério (536/537) foi deposto e substituído pelo Papa Vigílio; São Martinho
(649/655), degredado pelo imperador Constante II, acolheu de coração aberto a
nomeação do sucessor, Santo Eugênio. Mais complicado foram os casos de Bento IX
(1032/1045) e Gregório VI (1045/1046), forçados a deixar a função por mau
comportamento.
O papa, porém, que, de acordo com a “Divina Comédia” de Dante Alighieri, «fez a grande renúncia", é São
Celestino V. Seu pontificado nem chegou a quatro meses: de 29 de agosto a 13 de
dezembro de 1294. Sentindo-se pequeno diante dos desafios da política
eclesiástica, abandonou o cargo e recolheu-se à vida eremítica. O último papa a
abdicar foi Gregório XII (1406/1415). Seu nome está ligado ao “Grande Cisma do Ocidente” (1378/1415), período em que tentaram
ocupar o sólio pontifício dois – e, em dado momento, três – papas ao mesmo tempo.
Para acabar com o escândalo, ele entregou sua demissão nas mãos de Martinho V
(1417/1431).
O gesto de Bento XVI condiz com a sua
visão do homem e da Igreja. A idade pesa. O cargo é exigente. A saúde diminui.
Reconhecer os próprios limites e desapegar-se do poder é sabedoria e heroísmo.
Pode-se servir à Igreja e à humanidade de mil maneiras. Para tanto, o que
importa é tomar consciência de que há tempos e ocasiões diferentes, próprias de
cada momento e de cada pessoa. Quem ama, sempre descobre o jeito certo de estar
presente e atuante, mesmo quando, por qualquer motivo, precisa se retirar e
deixar que outros ocupem o lugar que até agora lhe pertencia.
Evidentemente, a renúncia recebeu
também outras interpretações, como a de Ferruccio De Bortoli, diretor do jornal
italiano "Corriere della Sera", que a viu
como resultado das intrigas que medram no Vaticano: «O ato do Papa foi encorajado pela insensibilidade de uma Cúria que, em
vez de confortá-lo e apoiá-lo, apareceu, por diversos de seus expoentes, mais empenhada
em jogos de poder e lutas fratricidas». De acordo com o cardeal brasileiro,
Dom João Braz de Aviz, «entre os cardeais, há muita fidelidade,
mas também tensões. Existem diferentes estilos, personalidades, formas de viver
as coisas. Uns querem o diálogo, outros destacam a autoridade». O Pe. Federico
Lombardi, porta-voz do Vaticano, parece sintetizar a opinião de uns e de
outros: «O Papa é uma pessoa de grande realismo
e conhece os problemas e as dificuldades. A renúncia foi uma mensagem à Cúria,
mas também a todos nós. Foi um ato de humildade, sabedoria e responsabilidade».
Um ato que abre novos horizontes no
modo de entender e de gerir a missão do papa na Igreja e que, por isso, fará
história.
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