sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Celebração dos 50 Anos da Campanha da Fraternidade


Sex, 15 de Fevereiro de 2013 15:29 por: cnbb

O Núncio Apostólico no Brasil, dom Giovanni d"Aniello, participou nesta sexta-feira, 15 de fevereiro, em Nísia Floresta (RN) da cerimônia que marcou os 50 anos da Campanha da Fraternidade, promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. A seguir, reproduzimos a íntegra do discurso apresentado por ele na solenidade.


Eminências e Excelências Reverendíssimas

Distintos membros do Regional Nordeste 2 da CNBB
Meus amigos,

Agradeço de coração o convite para participar do lançamento da Campanha da Fraternidade de 2013, numa celebração que faz parte da comemoração dos 50 anos que, por iniciativa do saudoso Cardeal Dom Eugênio de Araújo Salles, iniciou sua caminhada de solidariedade e de esperança da Igreja no Brasil.

Ao Arcebispo de Natal, Dom Jaime Vieira da Rocha, minhas sinceras homenagens de gratidão também por aceitar que a celebração fosse realizada nesta Igreja local, relembrando a primeira Campanha realizada na Arquidiocese de Natal, em abril de 1962.
A visita de Suas Eminências e Excelências a Nísia Floresta e Timbó teve um expressivo significado para a história da evangelização no Brasil, pois refletia a particularidade de recordar o objetivo primordial da Campanha, destinada a recolher meios para as obras sociais e apostólicas da Arquidiocese. Sua importância foi logo percebida, pois, nos anos seguintes, estendeu-se, através de seus diversos temas, a todo o território nacional.

Como foi justamente ressaltado pelo Secretário Executivo da Campanha, o Padre Luiz Carlos Dias, a edição de 2013, além de ser um momento comemorativo, será também um momento de revisão da Campanha da Fraternidade, frisando a necessidade de um aprimoramento da Campanha para que esta possa ser sempre mais um “forte poder de evangelização”.

Penso que todos estamos de acordo que esta celebração adquire uma importância ainda maior, considerando que estamos no Ano da Fé que, como afirmou o Santo Padre, foi instituído para suscitar “em cada crente, o anseio de confessar a fé plenamente e com renovada convicção, com confiança e esperança” (Carta Apostólica Porta Fidei, 9). Nesse sentido, o tema da Campanha, sugerido e aprovado para este ano, não podia ter sido melhor: “Fraternidade e Juventude”. Por certo, as diretrizes propostas são dirigidas a todos os católicos indistintamente, mas existe uma feliz coincidência no seu objetivo, se pensarmos que, dentro de poucos meses, o Brasil será sede da Jornada Mundial da Juventude.

Essa convocação foi feita pelo Papa Bento XVI ao anuncia o lema da Jornada Mundial da Juventude Rio 2013. “Ide e fazei discípulos entre todas as nações” (Mt 28,19), durante a audiência geral no dia 24 de agosto.

Em 2011, na Capital da Espanha, o Papa chamou aquela Jornada de “uma formidável experiência de fraternidade, de encontro com o Senhor, de partilha e de crescimento na fé: uma verdadeira cascata de luz”.

Por isso, é tão importante que os jovens do Brasil e do mundo assumam desde agora esse chamado à missão e participem da Jornada como testemunhas vivas do Cristo.

Esse tema é para ser refletido e meditado: fazer discípulos e chamar outras pessoas para a comunhão e o convívio com o Senhor. Esse mandato, essa missão já está anunciada nos Evangelhos. E, na verdade, só faz discípulo quem já é discípulo, quem convive com o Senhor.

“O que ganha o discípulo de Jesus? Ganha a pertença ao reino, a certeza do amor de Deus, ganha a certeza de ser para os outros sinal de misericórdia e amor. Ganha o levar e doar a paz do Senhor.  São esses os frutos e os dons de que o mundo mais precisa. O perdão, a misericórdia, a paz é que farão diminuir na sociedade, no mundo de hoje, a violência, a guerra, a corrupção, a maldade, tudo aquilo que tira a possibilidade do jovem crescer e colocar toda a sua riqueza e vitalidade a serviço da humanidade”, afirmou o Papa.
No mandato final do texto de Mateus – “Ide e fazei discípulos entre todas as nações” – está o grande sonho de todos, porque o contato com o Senhor, a amizade com Ele, desperta o que cada um tem de melhor em si mesmo.

“Vivemos num mundo onde há muitos desperdícios, perdas humanas por falta de chance. O convívio com o Senhor desperta o que temos de melhor. O  anúncio “Ide e fazei discípulos entre todas as nações” é um anúncio para a vida toda. Em nenhum momento podemos interrompe-lo, porque ele supõe que quem é amigo do Senhor, por sua vida e por seu estar no mundo, comunica aos outros a luz, a beleza e a alegria de ser discípulo do Senhor. Essa é a missão de que precisa a nossa Igreja”.

“Ide e fazei discípulos entre todas as nações!” (Mt 28,19) é o lema da Campanha.
Confiando-nos este mandato, o Senhor quis acentuar a confiança que em nós deposita e confirmar os sentimentos de amizade que nutre por aqueles que estão dispostos a segui-lo.
Amigos e mensageiros! Que combinação maravilhosa, que descoberta extraordinária a de saber-nos amigos de Cristo e seus colaboradores na construção do Reino. Mas também, quanta disponibilidade encerra e quão grande tem de ser nossa consciência ao sabermos que o Senhor quer servir-se de nós para espalhar seu amor pelo mundo inteiro.

Como disse o Santo Padre Bento XVI em sua mensagem à Juventude em 2012: “A Igreja tem a vocação de levar ao mundo a alegria; uma alegria autêntica e duradoura, aquela que os anjos anunciaram aos pastores de Belém na noite do nascimento de Jesus (cf. Lc 2,10). No difícil contexto atual, muitos jovens ao vosso redor tem uma imensa necessidade de sentir que a mensagem cristã é uma mensagem de alegria e de esperança!”

Como a Igreja nos ensina, esta missão tem de ser levada à frente com amor.
Como nos lembra o Santo Padre Bento XVI em sua encíclica: Deus caritas est, esse amor não é uma condição abstrata, mas é uma pessoa: Jesus; é um acontecimento através de sua encarnação, morte e ressurreição. Algo que não acabou, mas que se repete e que age em todos os momentos de nossa vida através da ação do Espírito Santo: a redenção continua sempre.

A humanidade tem caminhado ainda agora e sempre caminhará com fome da palavra e do conhecimento de Deus, mesmo que muitas pessoas não estejam conscientes dessa profunda necessidade de suas almas. E ao conceder-nos o dom da fé, o Senhor impõe-nos o dever de despertarmos e de despertar aqueles que se encontram mergulhados no sono da ineficácia e da morte.

Compete-nos o dever diário de renovar o desejo de colocar Cristo no cume e no íntimo das realidades humanas. Para isso, é necessário crescer no relacionamento pessoal com Deus e na entrega aos outros, contribuindo com o nosso grãozinho de areia – a entrega diária total – para a construção de um mundo renovado pela graça e pelo sal do Evangelho, que o Senhor confiou aos seus discípulos.

Precisamente por isso, a formação da juventude deve ter sempre uma especial importância nas diretrizes pastorais de cada Diocese. Em várias ocasiões, o Santo Padre Bento XVI fez notar as contradições do tempo em que vivemos. “Em várias partes do mundo, existe hoje um estranho esquecimento de Deus. Parece que tudo caminha igualmente sem Ele. Mas existe, ao mesmo tempo, também um sentimento de frustração, de insatisfação de tudo e de todos. É espontâneo exclamar: não é possível que esta seja a vida! Deveras, não. E assim, juntamente com o esquecimento de Deus existe um “boom” do religioso. Não quero desacreditar – diz o Santo Padre – tudo o que existe neste contexto. Pode existir nisto também a alegria sincera da descoberta. Mas para dizer a verdade, não raramente a religião se torna quase um produto de consumo. Escolhe-se aquilo de que se gosta, e alguns sabem até tirar dela algum proveito. Mas a religião procurada a seu ‘bel-prazer’ no fim não nos ajuda” (Homilia, 21-8-2005). E o Papa concluía com o seguinte convite: “Ajudai os homens a descobrir a verdadeira estrela que nos indica o caminho: Jesus Cristo!”

Não é por acaso esse risco que a nossa juventude está correndo? Analisando os ensinamento dos Santos Padres, Bento XVI detém-se num ponto de particular importância para os momentos atuais. Ele afirma que o grande erro das antigas religiões pagãs consistiu em ignorar os caminhos traçados no fundo das almas pela Sabedoria divina. “Por isso, o ocaso da religião pagã era inevitável: fluía como consequência lógica do afastamento da religião reduzida a um conjunto artificial de cerimônias, convenções e hábitos” (Discurso na audiência geral, 21-2-2007). O Papa acrescenta que os antigos Padres e escritores cristãos, pelo contrário, optaram pela “verdade do ser contra o mito do costume” (Ibidem). Tertuliano, como menciona o Pontífice, escreveu: “Dominus noster Christus veritatem se, non consuetudinem, cognominavit Cristo afirmou ser a verdade, não o costume”. (Sobre o véu das virgens, I, 1 PL 2,889). O Sucessor de Pedro nos assinala que “a este propósito observe-se que a palavra consuetudo, aqui empregada por Tertuliano referindo-se à religião pagã, pode ser traduzida nas línguas modernas com as expressões <<moda cultural>>, <<moda do tempo>>” (Ibidem).

Não tenhamos dúvidas: apesar da aparente vitória do relativismo em alguns lugares, esse modo de pensar e de desorientar tantas pessoas acabará por desmoronar como um castelo de cartas de baralho, por não estar escorado na verdade de Deus Criador e Providente, que guia os caminhos da história. Ao mesmo tempo, a realidade que vemos à nossa volta deve nos encorajar a não nos abandonarmos e a não abandonar as pessoas que estão num estado de desilusão e de falta de conteúdo.

Nossos jovens necessitam da fé e do vigor que ela nos transmite. A eles é preciso dizer: “Convençam-se e suscitem nos outros a convicção de que nós, os cristãos, temos de navegar contra a corrente. Não se deixem levar por falsas ilusões. Pensem bem: contra a corrente andou Jesus, contra a corrente foram Pedro e os outros primeiros apóstolos e todos aqueles que ao longo dos séculos quiseram ser discípulos fiéis do Mestre. Tenham, pois, a firme persuasão de que não é a doutrina de Jesus Cristo que deve se adaptar aos tempo, mas sim os tempos é que devem abrir-se à luz do Salvador”.

Vamos confiar nas palavras de Bento XVI quando vem afirmando que: “Caritas Christi urget nos – o amor de Cristo nos impele” (2Cor 5,14): é o amor de Cristo que enche os nossos corações e nos impele a evangelizar. Hoje, como outrora, envia-nos pelas estradas do mundo a proclamar seu Evangelho a todos os povos da terra (cf. Mt 28,19). Com seu amor, Jesus Cristo atrai a Si os homens de cada geração: em todo o tempo, Ele convoca a Igreja, confiando-lhe o anúncio do Evangelho, com um mandato que é sempre novo. Por isso, também hoje é necessário um empenho eclesial mais convicto em favor de uma nova evangelização, para descobrir novamente a alegria de crer e reencontrar o entusiasmo de comunicar a fé (Porta Fidei, 7).

Não creio sair do objetivo desta minha intervenção se procurarmos renovar nossa convicção de que, na linha pastoral de qualquer Diocese, devemos incluir a necessidade imperiosa de que a juventude seja orientada e formada por um sadio conceito da família.
É conhecida a sentença que, com pequenas variantes, afirma “Família sadia, sociedade sadia. Família em crise, sociedade em crise”.

A abrangência dessa afirmação poder ser discutível, mas é inegável que encerra um grande núcleo de verdade.

Sobre a importância social da família já se escreveram volumes alentados, análises e estudos muito ponderáveis. Eu desejaria agora, concretamente, frisar apenas uma das razões que, a meu ver, evidencia o nexo de casualidade existente entre família sadia e sociedade sadia.

Refiro-me ao fato que, na sociedade, não há nenhum âmbito de crescimento humano e moral, nenhum ambiente educativo, nenhum “coletivo” tão propício e eficaz para o cultivo das virtudes como a família bem estruturada. E isso parece-me de suma importância, levando em consideração que, no mundo atual, aparece sempre mais evidente que a sociedade precisa das virtudes como de um oxigênio vital, de virtudes aprendidas, arraigadas, exercidas e desenvolvidas até a maturidade. Decadência social e ignorância ou desprezo pelas virtudes são a mesma coisa.

A não ser que hoje ainda se considerem vigentes as afirmações feitas pelo poeta Paul Valéry, em famoso discurso à Academia Francesa: <<Virtude, senhores, a palavra ‘virtude’, já morreu, ou pelo menos, está em vias de extinção [...]. Receio que não exista jornal algum que a imprima ou se atreva a imprimi-la com outro sentido que não seja o do ridículo. Chegou-se a tal extremos, que as palavras ‘virtude’ e ‘virtuoso’ só podem ser encontradas no catecismo, na farsa, na Academia e na opereta>>.

Seria de desejar que atitudes desse tipo tivessem ficado enterradas no passado. Quando Valéry falava, virtude sugeria limite, enquadramento, barreira obsoleta, num ambiente ébrio do vinho novo da liberdade. A centralidade da virtude na formação do ser humano havia cedido o espaço à liberdade sem limites, numa eufórica erupção de individualismo egocêntrico (que, paradoxalmente, na primeira metade do século XX, descambou nas duas maiores tiranias da história). A sociedade atual, com suas mazelas, com os preocupantes desvios de uma parte não pequena da juventude (basta pensar nas drogas) é de molde a reacender uma autêntica “saudade das virtudes”. Mas, pergunto-me, será possível ao mesmo tempo em que se exalta como nunca a “liberdade ilimitada”, como único valor moral, ao passo que se desprestigia a família?

Pois bem, diante disso, creio necessário que nos perguntemos: onde é que a nossa juventude aprende a virtude, que dever ser, acima de tudo, um valor reconhecido e amado pela criança, pelo adolescente e pelo jovem, uma convicção enraizada, uma prática exercida com empenho, da qual depende o bem da pessoa e da sociedade?

A família, sim, a família já foi e ainda agora deveria ser o ambiente de cultura mais propício para a descoberta, a valorização, o aprendizado e a prática das virtudes.  Mas, em que é está a família entre nós? Será que o mundo de hoje esquece que a família é a estrutura vital e moral indispensável para a construção do bem da sociedade?
Hoje em dia, como dizia o jurista Pedro J. Viladrich, a sociedade tem uma escolha a fazer: ou ser uma “constelação de famílias”, dessas células primárias, vitais, naturais, sadias, que constituem o bom tecido social; ou ser um “aglomerado de indivíduos”, preso cada um deles ao interesse particular e ligado aos demais por aquilo que Gustave Thibon chamava de “egoísmo compartilhado”.

Portanto, queridos irmãos no episcopado, cabe a nós também a missão de ensinar a nossos jovens que, como filhos e filhas de Deus pelo Batismo, tem a importante tarefa de fazer que o amor entre nós seja uma projeção do amor que acontece entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo, simbolizado na cruz peregrina da Jornada Mundial da Juventude e que no Rio será mais uma vez derramado sobre todas as nações, através dos jovens que participarão naquela significativa manifestação.

É esta a tarefa que, junto com a cruz, os jovens brasileiros levarão para o Rio de Janeiro: levar ao mundo inteiro, através de seu testemunho, o amor que Deus tem por nós.

Encaminhemo-nos, junto com nossos jovens, para o Rio de Janeiro na perspectiva do Ano da Fé, esta linda iniciativa que quer ser um CONVITE para uma autêntica e renovada conversão ao Senhor, único Salvador do mundo que, doando seu amor, introduziu numa nova vida.
Em virtude da fé, possa esta vida nova plasmar toda a existência humana segundo a novidade radical da ressurreição, transformando nossas mentalidades e pensamentos para sermos, pouco a pouco, purificados e transformados em Cristo.

Eminências, Excelência, caros amigos,
Ao concluir, faço votos que a Campanha da Fraternidade alcance seus objetivos primários de revitalizar em todos os segmentos da sociedade o sentido mais nobre dos valores que norteiam a juventude brasileira.

Agradeço a atenção dispensada e peço ao Altíssimo abundantes graças para todos, a fim de que a luz do Espírito Santo ilumine esse evento de capital importância para a Igreja e para o Brasil.
Muito obrigado!
+ Giovanni d’Aniello
Núncio Apostólico

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