segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Operário da vinha do Senhor


Seg, 18 de Fevereiro de 2013 16:16 por: cnbb

Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil

Vaticano, Praça de S. Pedro, 19 de abril de 2005. Fiéis do mundo inteiro estavam lá, com os olhos fixos na pequena chaminé da Capela Sixtina. Quando apareceu a fumaça branca, todos explodiram em grito de alegria, na certeza de que o novo papa havia sido eleito. Os sinos da Basílica começaram a tocar. Pouco depois, foi proclamado “Habemus Papam” (Temos Papa!) e foi anunciado o nome do sucessor de João Paulo II: Cardeal Joseph Ratzinger, que escolheu o nome de Bento XVI. O novo Papa apareceu na sacada da Basílica, com um semblante sereno e tímido, acenou para a multidão e, como que pedindo desculpas por estar ali, disse suas primeiras palavras como sucessor de Pedro: “Sou um humilde operário da vinha do Senhor!”


Nessa sua auto-apresentação estava resumido o que ele pretendia fazer como sucessor de Pedro. O novo “operário da vinha do Senhor” sabia que não tinha o jeito de João Paulo II – isto é, a popularidade e a espontaneidade do papa polonês. Mas essa é a maneira de agir do Espírito Santo: sopra onde quer e como quer, não se repetindo, e escolhendo para cada momento da Igreja um “Pedro” diferente. 

Grande teólogo e profundo conhecedor dos desafios da Igreja, Bento XVI sabe apresentar as riquezas do Evangelho de forma simples e objetiva. Sua primeira encíclica – “Deus caritas est” (Deus é amor) – comprovou isso: “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele (1Jo 4,16). Essas palavras da Primeira Carta de João exprimem, com singular clareza, o centro da fé cristã... O amor de Deus por nós é questão fundamental para a vida e coloca questões decisivas sobre quem é Deus e quem somos nós” (DC, 1 e 2).
Bento XVI tem a capacidade e a coragem de apontar a todos as exigências do seguimento de Cristo. Falando, por exemplo, a jovens, disse-lhes ter consciência de que só os conquistaria para Cristo se lhes falasse a verdade: “Os santos são os verdadeiros reformadores do mundo... Só dos santos, só de Deus provém a verdadeira revolução, a mudança decisiva do mundo... Não são as ideologias que salvam o mundo, mas unicamente a volta ao Deus vivo, que é o nosso criador, a garantia de nossa liberdade, a garantia daquilo que é realmente bom e verdadeiro... E o que nos pode salvar, a não ser o amor?... Não construímos para nós um Deus pessoal, um Jesus pessoal, mas cremos e nos prostramos diante daquele Jesus que nos é mostrado pelas Sagradas Escrituras e que na grande procissão dos fiéis chamada Igreja se revela vivo, sempre conosco e, ao mesmo tempo, sempre diante de nós” (20.08.05).
O Bispo de Roma, sucessor de Pedro, tem como missão ser o sinal visível de comunhão na Igreja. Entende-se, pois, a surpresa que tomou conta da Igreja e do mundo ao ser divulgada, na manhã da última segunda-feira, dia 11 de fevereiro de 2013, sua renúncia ao ministério que exerce. As razões que apresentou para essa decisão foram claras: “Minhas forças, devido à idade avançada, já não são idôneas para exercer adequadamente o ministério petrino... Para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor esse que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado”.

Imagino quanta oração, reflexão e sofrimento precederam essa decisão, tomada conscientemente e com plena liberdade. Admirador de sua pessoa e de seus textos, e conhecendo-o pessoalmente desde 1985, sofri com sua decisão, mas a compreendi. Fica para nós o seu exemplo de humildade e de realismo: sentindo que não está mais em condições de exercer a função de “operário da vinha do Senhor” que havia assumido, renunciou, para não prejudicar a missão da Igreja. Ficam para nós seus ensinamentos, revestidos de uma imensa paixão por Jesus Cristo. Ficam para a Igreja seus livros sobre Jesus de Nazaré, que apresentam o Cristo vivo do Evangelho – o Cristo a quem Bento XVI dedicou sua vida e a quem quer servir agora na oração.

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