Seg, 03 de Dezembro de 2012 14:12 por: cnbb
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo (SP)
Arcebispo de São Paulo (SP)
Fui Secretário Geral da CNBB de abril
de 2003 a maio de 2007. Presidente e Vice Presidente eram, respectivamente, o
Cardeal Dom Geraldo Majella Agnelo e Dom Antonio Celso de Queirós. Foi um
período muito rico de experiências para a CNBB e também párea a minha vida de
bispo.
Na Assembleia Geral da CNBB de 2003, em
que fomos eleitos, começavam a ser aplicados o novo Estatuto e Regimento Geral
da Conferência; várias questões novas precisavam ser introduzidas na CNBB, como
o Conselho Episcopal Pastoral (CONSEP), formado pela Presidência e pelos
presidentes das Comissões Episcopais Pastorais, cada uma com atribuições
próprias. As mudanças em relação à anterior Comissão de Pastoral foram
significativas e, introduziram uma nova estrutura e dinâmica na vida da CNBB.
Tratava-se também de traduzir num novo
Projeto Nacional de Evangelização os impulsos passados à Igreja pela celebração
do grande Jubileu do início do 3º milênio cristão. Depois de muito refletir, o
CONSEP aprovou e lançou o Projeto “Queremos ver Jesus, caminho, verdade e
vida”, que levava em conta, sobretudo, a Exortação Apostólica pós-sinodal
“Ecclesia in America” e a Carta Apostólica “Novo Millennio ineunte”, ambas do
Papa João Paulo II.
Por esse Projeto foram produzidos os
Subsídios Homiléticos da CNBB, publicados também depois desse Projeto; o
subsídio catequético “Sou Católico e vivo a minha fé” e a edição própria da
Bíblia da CNBB. Também a criação das Edições CNBB foi desse período, como parte
do Projeto de Evangelização.
O período compreendido entre 2003 e
2007, também foi marcado pela busca de mais recursos econômicos para a
sustentação dos trabalhos da Conferência, em vista da gradual diminuição de
recursos externos que sempre haviam servido de base para as atividades dos
projetos e iniciativas pastorais da Conferência. Também com essa finalidade
foram criadas as Edições CNBB.
Também a criação da Comissão Episcopal
Especial para a Amazônia foi desse período e devia dar uma atenção especial
para as Dioceses e Prelazias da Região Amazônica. Da mesma forma, foi dessa
época a criação do Centro de Fé e Política Dom Helder Câmara, para a formação
de novas lideranças políticas para o Brasil, à luz da Doutrina Social da
Igreja. E, para assessorar a CNBB nas questões de bioética, que estavam no
centro de debates na opinião pública e de decisões parlamentares, foi criado um
Grupo de Peritos em Bioética para a assessoria da CNBB.
A CNBB se empenhou no diálogo com os
Parlamentares, para evitar a aprovação do Projeto de lei que autorizaria o uso
de embriões humanos em pesquisa científica. Infelizmente, aquele Projeto de Lei
passou e o uso de embriões para obter “células tronco embrionárias” humanas foi
legalizado; o que se sabe, é que houve uma manobra questionável no Congresso,
na qual foram fundidos dois Projetos de Lei, diversos nos seus conteúdos, no
único Projeto de Lei “da biodiversidade”: o do uso de embriões humanos na
pesquisa científica e o da liberação do uso de sementes transgênicas no Brasil;
o Projeto do uso de embriões não teria sido aprovado sem os interesses do
agronegócio e dos Parlamentares representantes dos ruralistas. O Projeto de Lei
“fundido” foi aprovado e quem acabou sacrificado, para liberar o uso das
sementes transgênicas, foram os embriões humanos.
Entre as questões sociais de maior
destaque, acompanhadas pela CNBB naquela época, esteve a demarcação da área
indígena Raposa Serra do Sol; com o apoio decisivo da CNBB, aquela área
indígena foi aprovada como “área contínua”.
Também em 2003, foram retomadas as
gestões junto à Santa Sé e ao Governo do Brasil para a elaboração de um Acordo
bilateral. Lembro de uma audiência decisiva em que o Presidente Lula, com
grande parte de seus Ministros, recebeu no Palácio do Planalto a Presidência da
CNBB, junto com o Sr. Núncio Apostólico, Dom Lorenzo Baldisseri, os
ex-presidentes da CNBB, Dom Ivo Lorscheiter e Dom Luciano Mendes de Almeida,
além do Cardeal Dom Cláudio Hummes, à época, Arcebispo de São Paulo. O
Presidente Lula, após ouvir muito sobre o Acordo pretendido pela CNBB,
demonstrou-se claramente favorável ao Acordo e deu ordens aos seus Ministros
para os encaminhamentos necessários, sob a coordenação do Ministro das Relações
Exteriores. Tive, então, a nítida percepção de que, finalmente, o Acordo seria
elaborado e assinado. De fato, isso aconteceu já em 2008, após um tempo de
elaboração considerado muito breve.
Durante o quadriênio em que fui
Secretário Geral da CNBB, foram dedicados muito tempo e energia à preparação da
5ª. Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, que
aconteceu em maio de 2007, em Aparecida. As reuniões preparatórias aconteceram
em Assunção, Buenos Aires, Bogotá e Aparecida; foi um trabalho exigente, que
foi compensado pelo excelente resultado da Conferência de Aparecida.
Ainda durante aquele quadriênio,
faleceu o Papa João Paulo II e foi eleito o Papa Bento XVI. Foram dois momentos
muito intensos para a vida de toda a Igreja. Lembro que fui convidado a ir ao
funeral do Papa João Paulo II, integrando a comitiva oficial do Presidente da
República; foi uma viagem única, com uma comitiva também única, integrada, além
do Presidente Lula e sua esposa, pelos ex-presidentes José Sarney e Fernando
Henrique Cardoso, e pelos presidentes do Senado e da Câmara; além deles, uma
representação bem eclética de religiões e Igrejas (Católica, Luterana e
Metodista), além de um Rabino e de um Xeique. Provavelmente, ninguém outro, que
não fosse o Papa, teria reunido num mesmo voo, personalidades tão
representativas e tão diversas...
Assisti na Praça de São Pedro a Missa
de inauguração do Pontificado do Papa Bento XVI. O presidente da CNBB, Cardeal
Dom Geral Majella Agnelo, é claro, esteve lá desde antes do funeral do papa
João Paulo II, pois participou do Conclave em que o Cardeal Joseph Ratzinger
foi eleito papa, em abril de 2005. Lembro bem da 1ª. visita que a Presidência
da CNBB fez ao papa, após a Assembleia Geral de 2005. Bento XVI foi muito
afável e mostrou grande interesse pelo Brasil. Como ele já havia confirmado a
realização da Conferência de Aparecida, também nós o convidamos, especialmente,
a visitar o Brasil. Na ocasião pedimos a canonização do Beato Antonio de
Santana Galvão. Explicamos-lhe quem foi Frei Galvão e o Papa mostrou interesse
especial pelo nosso pedido, dizendo que sua eventual canonização poderia ser
muito significativa para o contexto da Conferência de Aparecida e seu tema –
“discípulos e missionários de Jesus Cristo para que nele, nossos povos tenha a
vida”.
Lembro também de três reuniões dos
representantes das Conferências Episcopais dos países de língua portuguesa
(lusófonos), das quais nossa Presidência participou: em Guiné Bissau, Maputo
(Moçambique) e Fátima. Foram encontros muito reveladores, em que pude perceber
realidades eclesiais e humanas bem diversas das nossas, do Brasil. A presença
do bispo de Macau, cujo território está hoje integrado na China, fez-me pensar
nas grandes possibilidades missionárias representadas por aquela pequena
presença católica na numerosíssima população chinesa.
Duas Campanhas da Fraternidade
marcaram, de maneira destacada, aquele quadriênio da Presidência da CNBB: sobre
a água (“água, fonte de vida”) e sobre as pessoas com deficiência (“vem para o
meio”). Ambas deixaram frutos significativos. Aquela sobre a água teve como fruto
uma Declaração ecumênica internacional sobre a “água, direito de todos e bem
comum não submetido às leis de mercado”. Essa Declaração, assinada em Genebra,
continua recebendo a adesão de vários países e organizações internacionais.
A preparação da visita do Papa Bento
XVI ao Brasil, em maio de 2007, foi uma experiência interessante e
enriquecedora. Muitas foram as reuniões, em níveis diversos, para a definição
de cada detalhe da visita, do programa, das responsabilidades, da logística...
O Papa vinha, sobretudo, para abrir a Conferência de Aparecida, como aconteceu
no dia 13 de maio daquele ano. Antes disso, porém, ele cumpriria em São Paulo
um programa que contemplava diversos eventos: acolhida no aeroporto, hospedagem
no Mosteiro de São Bento, visita de cortesia às Autoridades Públicas no Palácio
dos Bandeirantes, encontro com a Juventude no estádio do Pacaembu, canonização
de Frei Galvão, o primeiro santo nascido no Brasil, no Campo de Marte, e o
encontro com os bispos do Brasil na Catedral Metropolitana de São Paulo. Tudo
isso, comportava uma logística estudada nos mínimos detalhes, envolvendo a
Nunciatura, a CNBB, o Itamaraty e as autoridades da Segurança, além, é claro,
das Arquidioceses de São Paulo e Aparecida.
Em 21 de março de 2007, quando o programa
já estava definido e faltavam menos de 2 meses para a chegada do papa ao
Brasil, acabei recebendo a nomeação de Arcebispo de São Paulo, vacante por
causa da transferência do Cardeal Dom Cláudio Hummes para Prefeito da
Congregação para o Clero, na Santa Sé. Tomei posse da Arquidiocese de São Paulo
no dia 29 de abril de 2007, dois dias antes de iniciar a Assembleia Geral da
CNBB, em Itaici – que era eletiva, e 10 dias antes da chegada do Papa em São
Paulo. Tive, portanto, o encargo e a honra de acolher e de hospedar o Santo
Padre em São Paulo. Quando o Papa veio, eu já não era mais integrante da
Presidência da CNBB, pois esta foi renovada na Assembleia Geral, encerrada no
dia 9 de maio de 2007, mesmo dia em que o Papa chegava a São Paulo.
Minha passagem pela CNBB deu-me a
oportunidade de conhecer mais a nossa Conferência e a realidade eclesial do
Brasil, rica, dinâmica e cheia de contrastes. Agradeço a Deus por isso. E
agradeço aos muitos colaboradores na CNBB, desde os funcionários, assessores,
subsecretários, colaboradores e benfeitores diversos. Pude também perceber mais
de perto o significado e a autoridade moral da CNBB para o Brasil e o
reconhecimento público que a Conferência gozava perante as diversas instâncias
da vida social. Essa autoridade moral foi fruto de uma história rica, que
já completa 60 anos, e que teve grandes protagonistas, como Dom Helder Câmara,
o Cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, Dom Ivo Lorscheiter, Dom
Antonio Celso de Queirós e Dom Luciano Mendes de Almeida, só para citar alguns.
A CNBB, nos seus 60 anos de história, já escreveu muitas páginas relevantes na
vida da Igreja e da sociedade brasileiras.
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