FONTE: CNBB – N2 – Catequese e Bíblia
Jesus tem uma atitude singular. Embora
fosse um judeu pleno, tinha muitas atitudes que se distanciavam dos costumes e
leis judaicas. Impressiona sua atitude em relação aos pecadores, aos
considerados impuros pelos chefes judeus. Jesus não teme ser visto com pessoas
de má fama, come com os cobradores de impostos, é capaz de oferecer água viva a
uma mulher samaritana, vai até a casa de Zaqueu... O Evangelho deste domingo
nos coloca Jesus diante dos acusadores de uma mulher adúltera que mereceria o
castigo, de acordo com a lei. O Senhor mais uma vez é desconcertante.
As pedras nas mãos dos fariseus
representam a nossa agressividade, nosso desejo de
vingança, nossa ânsia pelo
protesto, pela crítica, pela atitude condenatória. Tal gesto muitas vezes vem
revestido de legalidade, quando quem pratica se considera puro, santo,
imaculado, cumpridor da lei, religiosamente perfeito... O ato de julgar e de
condenar revela a atitude de quem se vê irrepreensível, mas na verdade se trata
de uma projeção. Quem condena não consegue ver o seu próprio pecado, e sem
conseguir trabalhar com as próprias falhas, projeta seus próprios erros nos
outros. Aquelas pedras representam o apego à lei, ao desejo de alcançar a
salvação e de se sentir sem débitos com Deus pela observância dos preceitos,
sem ver a amplitude da misericórdia do Pai de Jesus Cristo, que dá a quem não
merece porque ama gratuitamente.
Jesus não se apressa em responder,
escrevendo no chão enquanto os algozes da pecadora exigem dele uma resposta
(não sabemos o que ele escreveu). Jesus dá a resposta desconcertante que cala a
turba: “Quem dentre vós não tiver pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma
pedra”. Quem de nós não tem pecado? Onde está o justo, o santo, o puro? Jesus
nos mostra o remédio contra o julgamento: reconhecer-se pecador e necessitado
do perdão. Para a mulher em farrapos restam as palavras ternas: “Mulher, onde
estão eles? Ninguém te condenou? Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora
em diante não peques mais”. Não importa o tamanho do crime, do pecado. Que
ninguém classifique ou coloque rótulos nos pecadores; o adultério não era pior
do que a hipocrisia farisaica. Aliás, as prostitutas precederão os entendidos
na lei no Reino dos Céus, afirmaria Jesus em outra passagem. Para aquela pobre
mulher restam os gestos carinhosos de um homem que consegue ver bem mais além
do que os seus defeitos. Ele enxerga a sua humanidade, vê a sua miséria, mas ao
mesmo tempo seu potencial. Para ela não é o fim, pois para Deus sempre haverá
uma nova chance, uma nova oportunidade.
“Não deveis ficar lembrando as coisas
de outrora, nem é preciso ter saudades das coisas do passado”, diz-nos o
profeta Isaías. Paulo também exorta sobre o olhar para frente: “Uma coisa,
porém, faço: esquecendo o que fica para trás, lanço-me para o que está à
frente”. Jesus deseja que a mulher siga o seu curso: “Eu também não te condeno.
Podes ir, e de agora em diante não peques mais”. Hoje somos convidados a olhar
para frente, esquecendo-se dos rancores do passado, dos pecados, das tristezas
que imobilizam a vida, dos traumas, daquilo que no presente é causa de queda,
de fracasso, de frustração. Deus nos faz olhar para o futuro. Sempre há um
caminho longo pela frente, sempre podemos mudar o curso da nossa vida, de nossa
história, basta que haja um desejo profundo de mudança no interior de nosso
coração.
Em nossos grupos da Igreja, constatamos
rixas, brigas pelo poder, ciúme... Ainda o julgamento nos destrói, muitas vezes
fruto da inveja de quem ainda não se ama o suficiente e não pode ver o sucesso
alheio. Ainda em nome da Lei de Deus excomungamos muitos de nossas Igrejas.
Ainda a misericórdia custa em tocar os corações. A Quaresma é um momento para
criarmos um coração livre daquilo que nos destrói – a agressividade do
julgamento e o rancor. E se fizermos parte do rol agraciado das prostitutas, ou
seja, daqueles que necessitam da misericórdia por não pertencermos ao grupo
oficial dos imaculados, resta-nos a bem-aventurança da ternura do Cristo em sua
voz firme e suave que afirma para seguirmos em frente, pois o que importa é o
nosso futuro e a grandeza da misericórdia de Deus.
Pe. Roberto Nentwig
Postado por Bíblia e Catequese às 08:43
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