terça-feira, 30 de julho de 2013

Avanços, discípulos e o dinheiro, o poder e a sexualidade




Seg, 29 de Julho de 2013 13:48 / Atualizado - Seg, 29 de Julho de 2013 13:55 por: cnbb

Avanços

Desde meus tempos de juventude ouvi falar de avanços. E qual não era meu entusiasmo quando ouvia falar de um teólogo avançado. Quase sempre o jovem é avesso a pensadores ou pessoas consideradas “reacionárias” ou retrógradas. Reacionário tinha uma conotação mais política em contraposição a revolucionário. Retrógrado dizia mais respeito ao pensamento e a certas práticas consideradas anacrônicas. A propósito tenho escutado com freqüência pessoas falarem de avanços. Não faz muito tempo ouvi de uma professora universitária, em entrevista radiofônica, considerações sobre união legal de homossexuais. Ela dizia que, em determinado país, a sociedade já admitia sem sobressaltos as celebrações de tais uniões. E afirmava que tal avanço ainda não estava acontecendo no Brasil.
Outros avanços são igualmente proclamados: divórcio, aborto, pesquisa com células-tronco embrionárias, difusão do uso de preservativos, Kit Gay. O leitor poderá acrescentar outros à lista que tende a se tornar cada vez mais longa. Entendo que o horizonte de compreensão que leva a falar de avanço nestes casos, e eventualmente em outros, é o avanço cultural no que diz respeito aos direitos da pessoa. Nosso País tem respondido parcialmente bem à exigência de promover os direitos da pessoa. Exemplo de real avanço nesse sentido, dentre outros, são o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso. Mas gostaria de recordar ao leitor quais foram os maiores avanços acontecidos na história humana e que, graças a Deus, apesar de nosso egoísmo, têm atenuado os males que afligem desde as origens a sociedade humana. Vou transcrevê-los tais como aparecem em sua carta magna, para o que peço ao leitor o silêncio de quem acolhe o avanço definitivo e insuperável para a promoção da dignidade humana. Ei-los:
Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás; quem matar será castigado pelo juízo do tribunal.
Eu, porém, vos digo: todo aquele que se irar contra seu irmão será castigado pelos juízes. Aquele que disser a seu irmão: Raca, será castigado pelo Grande Conselho. Aquele que lhe disser: Louco, será condenado ao fogo da geena... Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher, já adulterou com ela em seu coração... Foi dito: Aquele que repudiar sua mulher dê-lhe uma carta de divórcio. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que repudia sua mulher, a não ser em caso de fornicação, faz com que ela adultere; e aquele que se casa com a repudiada comete adultério.... Ouvistes ainda o que foi dito aos antigos: Não jurarás falso, mas cumprirás para com o Senhor os teus juramentos. Eu, porém vos digo: não jureis em hipótese alguma: nem pelo céu nem pela terra...Seja vosso sim , sim, e vosso não, não. O que passa disso vem do Maligno.
Tendes ouvido o que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao mau. Se alguém te ferir a face direita, oferece-lhe também a outra. Se alguém te citar em justiça para tirar-te a túnica, cede-lhe também a capa. Se alguém vem obrigar-te a andar mil passos com ele, anda dois mil. Dá a quem te pede e não te desvies daquele que te quer pedir emprestado.
Ouvistes que foi dito: Amarás teu próximo e odiarás teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos. Se amais somente os que vos amam, que recompensa tereis? Não fazem assim os próprios publicanos? Se saudais apenas vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não fazem isto também os pagãos. Portanto, sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito.”( Cf. Mt, capítulos 5,6 e 7).
Todo o ensinamento de Jesus é a explicitação daquilo que Ele mesmo viveu, cuja síntese é o sermão da montanha, de onde tirei os trechos em que Ele afirma: “foi dito aos antigos...Eu, porém vos digo”. Convido o leitor a meditar todo o sermão que começa com uma proposta de felicidade, que é o inverso daquilo que o mundo está a propor e que começa assim: “Bem-aventurados – felizes - os pobres em espírito, porque deles é o reino dos Céus”. Jesus encontrou forte resistência, também da parte dos discípulos, quando propôs o espírito de pobreza – desapego – em lugar do amor ao dinheiro (Mt 19,23-26); o espírito de serviço em lugar do gosto pelo poder (Mt 20,20-28); o amor de doação no lugar do instinto de posse na relação homem-mulher (Mt 19,1-12). Mas sobre essa resistência refletiremos na próxima vez.
Oxalá todas as leis se inspirassem nesses avanços definitivos e insuperáveis para fazer avançar a convivência humana na direção do eticamente ótimo!

Os discípulos e o dinheiro
No último artigo desta coluna, ao comentar sobre “avanços”, referindo-me a leis que legitimam formas de comportamento que rompem com costumes incorporados à cultura, pela influência do cristianismo, afirmei que avanço mesmo de verdade é a proposta de vida de Jesus tal como vem descrita nos capítulos quinto, sexto e sétimo do evangelho segundo São Mateus. Com Jesus a ética judaica deu um incrível salto de qualidade. Basta lembrar este item: “Ouvistes que foi dito: Amarás teu próximo e odiarás teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos perseguem”. (Mt 5,43). A proposta de Jesus pega o ser humano pela raiz para chamá-lo a uma liberdade profunda que lhe permita uma verdadeira relação de autonomia e de amor com o próximo. O sermão da montanha não abole a lei dada no Monte Sinai a Moisés, mas a leva à plenitude. O caminho ensinado por Jesus aos poucos vai sendo explicitado para os discípulos. Jesus, entretanto, encontra forte resistência da parte deles, sobretudo quando propôs: o espírito de pobreza – desapego – em lugar do amor ao dinheiro (Mt 19,23-26); o espírito de serviço em lugar do gosto pelo poder (Mt 20,20-28); o amor de doação no lugar do instinto de posse na relação homem-mulher (Mt 19,1-12). Analisemos hoje o espírito de pobreza. Para tal cito duas passagens: a) “Ninguém pode servir a dois senhores: ou vai odiar o primeiro e amar o outro, ou aderir ao primeiro e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”... “Por isso, eu vos digo: não vivais preocupados com o que comer ou beber, quanto à vossa vida; nem com o que vestir, quanto ao vosso corpo. Afinal, a vida não é mais que o alimento, e o corpo, mais que a roupa? Olhai os pássaros do céu: não semeiam, não colhem, nem guardam em celeiros. No entanto, o vosso Pai celeste os alimenta. Será que vós não valeis mais do que eles? Quem de vós pode, com sua preocupação, acrescentar um só dia à duração de sua vida? E por que ficar tão preocupados com a roupa? Olhai como crescem os lírios do campo. Não trabalham, nem fiam. No entanto, eu vos digo, nem Salomão, em toda a sua glória, jamais se vestiu como um só dentre eles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje está aí e amanhã é lançada ao forno, não fará ele muito mais por vós, gente fraca de fé?Portanto, não vivais preocupados, dizendo: ‘Que vamos comer? Que vamos beber? Como nos vamos vestir? Os pagãos é que vivem procurando todas essas coisas. Vosso Pai que está nos céus sabe que precisais de tudo isso. Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo. Portanto, não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois o dia de amanhã terá sua própria preocupação! A cada dia basta o seu mal. (Mt 6,24-34).
Jesus fala de dois senhores. Só Deus é o Senhor. Essa é a razão por que Paulo vai chamar o amor às riquezas – avareza – de idolatria. (Cl 3,5). Servir a Deus é libertar-se da escravidão ao dinheiro e se tornar verdadeiramente livre para Deus, fonte de alegria e de paz para os outros. O segredo de uma vida feliz está em viver a palavra de Jesus: “buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo”. b) “Jesus disse então aos seus discípulos: Em verdade vos declaro: é difícil para um rico entrar no Reino dos céus! Eu vos repito: é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus. A estas palavras seus discípulos, pasmados, perguntaram: Quem poderá então salvar-se? Jesus olhou para eles e disse: Aos homens isto é impossível, mas a Deus tudo é possível” (Mt 19,23-26).
Jesus faz essa advertência aos discípulos que assistiram a seguinte cena: Jesus, diante de um homem rico, provavelmente jovem, que sente o desejo de um compromisso mais profundo com Deus, convida-o a vender tudo e distribuir aos pobres para depois segui-lo. “O moço, ouvindo essa palavra, saiu pesaroso, pois era possuidor de muitas propriedades” (cf. Mt 19,16-22) Verificamos a mentalidade dos discípulos quando, diante da palavra de Jesus sobre a dificuldade para um rico de entrar no Reino de Deus, ficaram “pasmados”e “perguntaram: quem poderá então salvar-se?” Os discípulos estavam também tomados pela convicção de que a riqueza material não só era desejável, mas também sinal da bênção divina. E, com certeza, presenciavam também naquele tempo a corrupção presente na vida da sociedade. A avareza, a sede insaciável de tudo possuir, é um dos pecados capitais. O espírito de pobreza dá sentido à riqueza, que, na administração de pessoas generosas, se torna um bem para todos. Há empresários que colocam o bem comum como razão de seus empreendimentos. Mas há escravos da riqueza. São infelizes. Para Deus, entretanto, é possível a conversão do rico. Não foi esse o caso de Zaqueu? (cf. Lc 19,1-10). No meio de tanta corrupção foi tocante saber, faz alguns dias, que um casal de moradores de rua, tendo encontrado uma pequena fortuna, procurou que ela chegasse ao seu legítimo dono.

Os discípulos e o poder

No último artigo desta coluna refletimos sobre a resistência dos discípulos à proposta de uma vida livre da obsessão pelo dinheiro. Outro aspecto da proposta de Jesus é o espírito de serviço em lugar do gosto pelo poder. Encontramos nos três evangelhos sinóticos os episódios que mostram o desejo de estar em postos importantes presente também no coração dos discípulos. (Cf. Mt 20,20-28; Mc 10,35-45; Lc 9,46-48; 22,24-27). Os episódios vêm narrados em Mateus e em Marcos logo após Jesus anunciar-lhes que Ele, o Messias, deveria sofrer a paixão e morte ( Cf Mt 20,17-19; Mc 10,32-34). . Em Lucas a discussão sobre quem deles seria o maior aparece logo depois da instituição da Eucaristia e do anúncio da traição de Judas, pouco antes da agonia de Jesus no jardim das oliveiras. São Lucas anotou; “Houve também uma discussão entre eles: qual seria o maior? Jesus lhes disse: os reis das nações as dominam e os que a tiranizam são chamados de Benfeitores. Quanto a vós, não deverá ser assim; pelo contrário, o maior dentre vós torne-se como o mais jovem, e o que governa como aquele que serve. Pois qual é o maior: o que está à mesa ou aquele que serve? Não é aquele que está à mesa? Eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve” (Lc 22,24-27). Na narrativa de Mateus (20,20-28) a mãe de Tiago e de João acompanha os filhos no pedido de se assentarem, um à direita e outro à esquerda de Jesus, quando Ele tivesse implantado seu reino no mundo. Esse pedido desencadeia entre os outros discípulos indignação, ciúme. A intervenção de Jesus tem o mesmo conteúdo que a descrita em Lucas e em Marcos com esse desfecho: “Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos”(Mc 10, 45). A insistência nesse aspecto de miséria do ser humano, necessitado da reverência, da submissão e da subserviência do outro, revela o quanto “o sereis como deuses” do capítulo terceiro do livro do Gênesis (3,5) se entranhou na alma da humanidade. Aí mora a resistência em reconhecer Deus como Senhor e Pai e, consequentemente, em reconhecer o outro como irmão a quem devemos servir. Riqueza e poder se reforçam mutuamente. Há o avarento que o é por insegurança. O poderoso, porém, necessita da riqueza para alicerçar o pedestal que o eleva acima dos demais e lhe dá a ilusão de onipotência. Mas, não é verdade que em todos nós, como uma erva daninha, sempre de novo brota o desejo de estar em posto mais elevado? A obsessão por cargos e funções de mando cria no seio das instituições as grandes e as pequenas guerras que infernizam a convivência humana. Jesus nos preveniu, nos episódios acima narrados, contra essa erva daninha: “Quanto a vós, não deverá ser assim; pelo contrário, o maior dentre vós torne-se como o mais jovem, e o que governa como aquele que serve. Interessante a observação de Jesus de que “os reis das nações as dominam e os que a tiranizam são chamados de Benfeitores”. É que os poderosos são admirados pelos que, não tendo poder, se sentem amparados na proximidade com eles. São adoradores do poder e “felizes” na subserviência: contentam-se com o aquecer-se à sombra do potentado. A “generosidade” do poderoso é a esmola com que ele recompensa seus admiradores e a forma como ele próprio alimenta a ilusão de ser o protetor dos pobres e dos fracos. Mas, ai do discordante! Esse será excluído da roda dos beneficiados do poder. “Entre vós não deverá ser assim”(Mt 20,26). Mais adiante Jesus dirá: “todos vós sois irmãos”(Mt23,8). Quando comecei a escrever esses últimos artigos, eu me referi à expressão “avanço”, quase sempre empregada para ressaltar a liberdade do indivíduo para fazer as escolhas que mais lhe convierem. Aos “sereis como Deus”, a serpente acrescentou: “conhecedores do bem e do mal”(Gên 3,5), capazes de determinar para si mesmos, sem outras referências que não o próprio arbítrio, o que é o bem e o mal. À pretensão de ser Deus por parte do ser humano, o próprio Deus responde fazendo-se homem. Bento XVI assim comenta o texto de Paulo (Fl 2,5-11): “Na Cruz de Cristo o homem é remido e a experiência de Adão é cancelada: Adão, criado à imagem e semelhança de Deus, pretendeu ser como Deus com as próprias forças, colocar-se no lugar de Deus, e assim perdeu a dignidade originária que lhe fora atribuída. Ao contrário, Jesus estava «na condição de Deus», mas rebaixou-se, entrou na condição humana, em total fidelidade ao Pai, para redimir o Adão que está em nós e restituir ao homem a dignidade que perdera. Os Padres realçam que Ele se fez obediente, restituindo à natureza humana, através da sua humanidade e obediência, o que se tinha perdido por causa da desobediência de Adão”. Embora não se possa obrigar através de leis que todos percorram esse caminho, seria muito bom que as leis humanas ajudassem a criar a cultura do serviço. A pergunta é: eu me sirvo de minha função ou sirvo aos irmãos no exercício de minha função?

Os discípulos e a sexualidade

Hoje, continuando a reflexão sobre “avanços” em nossa cultura, quero abordar a temática relativa à dimensão afetivo-sexual do ser humano. Os pretensos “avanços” propalados nessa área são: uso de preservativo, liberdade sexual, divórcio, legitimação e equiparação ao casamento de uniões de pessoas do mesmo sexo. Começo recordando a palavra de Jesus quando propôs o caminho da felicidade para os discípulos: “Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher, já adulterou com ela em seu coração...Foi dito: Aquele que repudiar sua mulher, dê-lhe uma carta de divórcio. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que repudia sua mulher, a não ser em caso de fornicação, faz com que ela adultere; e aquele que se casa com a repudiada comete adultério.( Cf. Mt 5,27-32). Para os discípulos de Jesus essa palavra era também difícil de ser ouvida. Mais tarde Jesus, depois de responder aos fariseus que lhe perguntaram sobre o divórcio, retoma, em particular com eles, esse ensinamento. Foi assim: “Os fariseus vieram perguntar-lhe para pô-lo à prova: É permitido a um homem rejeitar sua mulher por um motivo qualquer? Respondeu-lhes Jesus: Não lestes que o Criador, no começo, fez o homem e a mulher e disse: Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e os dois formarão uma só carne? Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, não separe o homem o que Deus uniu. Disseram-lhe eles: Por que, então, Moisés ordenou dar um documento de divórcio à mulher, ao rejeitá-la? Jesus respondeu-lhes: É por causa da dureza de vosso coração que Moisés havia tolerado o repúdio das mulheres; mas no começo não foi assim. Ora, eu vos declaro que todo aquele que rejeita sua mulher, exceto no caso de matrimônio falso, e desposa uma outra, comete adultério. E aquele que desposa uma mulher rejeitada, comete também adultério. Seus discípulos disseram-lhe: Se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar! Respondeu ele: Nem todos são capazes de compreender o sentido desta palavra, mas somente aqueles a quem foi dado. Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder compreender, compreenda. Foram-lhe, então, apresentadas algumas criancinhas para que pusesse as mãos sobre elas e orasse por elas. Os discípulos, porém, as afastavam. Disse-lhes Jesus: Deixai vir a mim estas criancinhas e não as impeçais, porque o Reino dos céus é para aqueles que se lhes assemelham. E, depois de impor-lhes as mãos, continuou seu caminho”( Mt 19,1-15).

Jesus, nessa fala, explica por que Moisés permitiu o divórcio: a dureza de coração dos homens. Aqui há um real avanço: a mulher não é objeto e o matrimônio é uma união estável onde a força unificante do amor, à semelhança do que acontece no mistério de Deus, faz dos dois uma única fonte de vida. Jesus ensina a igualdade de direitos e de deveres. Interessante que, na continuidade do ensino de Jesus sobre a indissolubilidade do matrimônio, aparecem as crianças trazidas para serem abençoadas. É direito das crianças que, geradas pela união de seus pais, recebam dessa união a segurança que necessitam para crescerem saudavelmente. As crianças se alimentam do amor que une seus pais. Precisam de um lar. Note o leitor que os discípulos estão, também eles, tomados por uma noção de matrimônio onde o homem é dono da mulher. Esta lhe deve total submissão. O evangelista anota: “Seus discípulos disseram-lhe: Se tal é a condição do homem da respeito da mulher, é melhor não se casar!”A resposta de Jesus é imediata: “Nem todos são capazes de compreender o sentido desta palavra, mas somente aqueles a quem foi dado. Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder compreender, compreenda”. Nessa fala Jesus coloca dentro do mesmo horizonte matrimônio e celibato. Ambos são uma forma de doação total e como tal só podem ser compreendidos com a ajuda da graça divina. O matrimônio, assumido no seu sentido pleno, é revelador do reino, encontro de Deus com a humanidade, em Cristo. A castidade celibatária, assumida como forma de servir a Deus, na oração e na dedicação às pessoas, é uma singular forma de manifestação do reino que está por vir em sua plenitude. É o verdadeiro amor que dá sentido ao casar-se e ao não se casar. Como seria bom que em nossas escolas isso fosse ensinado às nossas crianças e jovens! Isto, sim, seria um grande avanço no sentido da de uma sociedade mais justa e saudável.

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