Dom Pedro Carlos Cipollini
Bispo de Santo André
Bispo de Santo André
O
avassalador desenvolvimento tecnológico ocorrido nos últimos quarenta anos,
está elevando o ser humano a uma categoria de quase onipotência. Através da
técnica, o ser humano multiplica sua presença nas vídeo conferências, faz
diagnósticos precisos na área da saúde, perscruta o universo e altera o ritmo
da natureza, entre outras façanhas que envolvem o auxílio de inúmeras e novas
máquinas inteligentes.
Diante
deste quadro se pode perguntar pela necessidade da fé em Deus, o que equivale a
perguntar sobre o valor da oração, pois somente reza quem tem fé.
Com tanto
poder em suas mãos o ser humano é tentado a se esquecer de Deus ou a substituir
o próprio Deus em sua vida, sendo Deus para si mesmo. Mas lá no seu íntimo o
homem percebe que permanece o lugar secreto onde mora o próprio Deus, pois o
homem é criado à imagem e semelhança de Deus. Criado para ser semelhante a
Deus. O problema, o conflito, surge quando quer ser semelhante a Deus sem Deus.
A Palavra
de Deus ensina que Deus é criador e amigo do ser humano. Tem satisfação em
entrar em contato com ele (Gn 3,8-9). Deus associa o homem à criação, fazendo
dele o guardião da natureza. E ao se assombrar diante da natureza e mesmo das
suas próprias capacidades, o ser humano carrega em si, neste assombro, um elemento
positivo de oração.
A oração
é dirigir-se a Deus que sabemos que nos ama e falar com Ele na simplicidade.
Jesus recomenda: “Importa orar sempre e não cessar de o fazer” (Lc 18,1). Jesus
reza sempre e ensinou a belíssima oração do Pai Nosso. É preciso orar não só
para pedir, mas para demonstrar amor por Deus. Até Ele, não chegarão palavras
desprovidas de sentimento. Orar é necessário para que sintonizemos nossa
vontade com a de Deus. Vontade que é a fonte de todo o bem.
O Brasil
no alvorecer da República, estava dominado pelo pensamento positivista que via
a religião como fruto da ignorância. Pois bem, neste período um dos brasileiros
que mais sobressaíram pela inteligência escreveu: “Oração e trabalho são os
recursos mais poderosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo
sublimar-se da alma pelo contato com Deus. O trabalho é o inteirar, o
desenvolver, o apurar das energias do corpo e do espírito, mediante a ação
contínua sobre si mesmos e sobre o mundo onde labutamos” (Rui Barbosa).
A Bíblia
dá-nos exemplos significativos de oração tanto pública como privada, sendo os
Salmos o exemplo mais universal. Neles estão espelhadas orações de súplica,
louvor, arrependimento, petição, orações que Jesus levará á perfeição. É
possível orar sempre, até em um mercado ou passeio solitário, no seu trabalho,
comprando ou vendendo, ou mesmo cozinhando, esta é a opinião de muitos santos.
À
pergunta que dá título a este artigo respondo com a surpreendente conversa de
dois personagens do inigualável romance de Guimarães Rosa: “O que mais penso,
texto e explico: todo o mundo é louco. O senhor, eu, nós, as pessoas todas. Por
isso é que se carece principalmente de religião: para se desendoidecer,
desdoidar. Reza é que sara da loucura. No geral. Isso é que é a salvação da
alma...” (Grande Sertão: Veredas p.8).
Que nesta
quaresma possamos percorrer o caminho da oração.
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