Escrito por CNBB
Publicado: 26 Dezembro 2015
Categoria: Cardeal Orani João Tempesta
Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
No Domingo após o Natal, dentro da oitava,
celebra-se a festa da Sagrada Família: Jesus, Maria e José. É o último domingo
do ano civil. O tema família esteve presente nos últimos tempos nos noticiários
devido à Assembleia Extraordinária e ao Sínodo dos Bispos sobre o tema.
Enquanto aguardarmos o documento pós-sinodal rezamos pela família que, como
recorda São João Paulo II, “é por onde passa o futuro da humanidade”. Celebrar
esta solenidade na Oitava do Natal é contemplar o ideal de família que deve ter
Jesus Cristo no centro de nossas casas.
Deus quis manifestar-se aos homens integrado numa
família humana. Ele quis nascer numa família, quis transformar a família num
presépio vivo. Pode-se dizer que neste domingo celebramos o “Dia da Família”.
A Palavra de Deus desta solenidade (Eclo. 3, 3-7.
14-17) lembra aos filhos o dever de honrarem pai e mãe, de socorrê-los e
compadecer-se deles na velhice, ter piedade, ou seja, respeito e dedicação para
com eles; isto é cumprimento da vontade de Deus.
São Paulo, em Cl 3, 12-21, elenca as virtudes que
devem reinar na família: sentimentos de compaixão, de bondade, humildade,
mansidão e paciência. Suportarem-se uns aos outros com amor, perdoar-se
mutuamente. Revestir-se de caridade e ser agradecidos. Se a família não estiver
alicerçada no amor cristão, será muito difícil a sua perseverança em harmonia e
unidade de corações. Quando esse amor existe, tudo se supera, tudo se aceita;
mas, se falta esse amor mútuo, tudo se faz sumamente pesado. E o único amor que
perdura, não obstante os possíveis contrastes no seio da família, é aquele que
tem o seu fundamento no amor de Deus.
O Evangelho (Lc 2, 22-40) apresenta passos da vida
da Sagrada Família. Em primeiro lugar, uma família integrada na comunidade de
fé de seu tempo. Uma família que cumpre seus deveres religiosos. Uma família
que vive a realidade do dia-a-dia. O Evangelho também relata a experiência de
Simeão, que sente a alegria de ter em seus braços o Divino Salvador, pois seus
“olhos viram a salvação”. E profetiza que Ele “está posto para a ruína e para a
ressurreição de muitos em Israel”.
A celebração deste domingo nos apresenta a Sagrada
Família como modelo para as nossas. E nos convida a recuperar os valores de uma
família verdadeiramente cristã, marcada pelo amor, pela fidelidade e pelo
casamento indissolúvel. Ela deve ser uma comunidade de fé e de oração, chamada
a ser defensora e promotora da vida.
A Sagrada Família é proposta pela Igreja como
modelo de todas as famílias cristãs: na casinha de Nazaré, Deus ocupa sempre o
primeiro lugar e tudo Lhe está subordinado. Os lares cristãos, se imitarem o da
Sagrada Família de Nazaré, serão lares luminosos e alegres, porque cada membro
da família se esforçará em primeiro lugar por aprimorar o seu relacionamento
pessoal com o Senhor e, com espírito de sacrifício, procurará ao mesmo tempo
chegar a uma convivência cada dia mais amável com todos os da casa.
A vida em Nazaré era laboriosa. Casa pobre, cuja
manutenção exigia a colaboração de todos. José, em sua pequena oficina de
carpinteiro, mãos calejadas no manejo dos instrumentos, ainda muito primitivos,
de sua arte. Maria, com os arranjos de dona de casa modesta. Diariamente descia
à fonte – a mesma que hoje é conhecida como fonte da Virgem – e entre as
mulheres do povo, como uma delas, enchia cântaros com que abastecer a casa.
Maria distribuía seu tempo entre o fuso e a cozinha, sem esquecer as orações e
o estudo da lei e dos Profetas. Jesus, primeiro em casa, à Mãe, depois na
oficina, a José, aliviava aos pais o peso do trabalho de cada jornada.
O Beato Paulo VI nos recorda as lições de Nazaré:
“Nazaré é a escola onde se começa a compreender a vida de Jesus: a escola do
Evangelho. Podemos aprender algumas lições de Nazaré: “uma lição de silêncio. O
silêncio de Nazaré ensina-nos o recolhimento, a interioridade, a disposição
para escutar as boas aspirações e as palavras dos verdadeiros mestres”.
(Alocução pronunciada em Nazaré a 5 de janeiro de 1964). “Uma lição de vida
familiar.
Que Nazaré nos ensine o que é a família, sua comunhão e amor, sua
beleza simples e austera, seu caráter sagrado e inviolável; aprendamos de
Nazaré o quanto a formação que recebemos é doce e insubstituível” (Idem).
“Uma lição de trabalho: aqui recordo que o trabalho não pode ser um fim
em si mesmo, mas, que sua liberdade e nobreza resultam, mais que de seu valor
econômico, dos valores que constituem o seu fim. Como gostaria de saudar aqui
todos os trabalhadores do mundo inteiro e mostrar-lhes seu grande modelo, seu
divino irmão, o profeta de todas as causas justas, o Cristo nosso Senhor”.
(Ibidem).
O Papa Francisco disse com clarividência “A família
é um grande ginásio de treino para o dom e o perdão recíproco”, e numa
sociedade como a hodierna “por vezes sem piedade, é indispensável que haja
lugares como a família, onde aprender a perdoar-se” (Audiência geral de 4 de
novembro de 2015). Vamos aprender, neste Ano da Misericórdia, a ser famílias
misericordiosas, escola de perdão e de compaixão.
Iluminados pela Palavra de Deus deste domingo após
a festa do Natal, somos chamados a ser famílias cristãs convictas e animadas
pelo Espírito diante de uma sociedade que está perdendo suas bases e
enfrentando uma das piores crises de identidade da história.
Hoje, de modo muito especial, pedimos à Sagrada
Família por cada um dos membros da nossa família e pelo mais necessitado dentre
eles. Encerramos com a oração à Sagrada Família: “Ó Deus de bondade, que nos
destes a Sagrada Família como exemplo, concedei-nos imitar em nossos lares as
suas virtudes, para que, unidos pelos laços do amor, possamos chegar um dia às
alegrias da vossa casa”. Amém! (Oração da coleta da Missa).
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