E, há exatos cinquenta anos, sob o olhar da Imaculada Conceição, terminava o Concílio Vaticano II
Começava uma nova jornada da Igreja peregrina pelas
estradas do mundo: a Igreja "em saída", que hoje o papa Francisco nos
chama a ser!
Diante de uma multidão imensa, a procissão branca e
prata dos 2.500 padres conciliares atravessou a Praça de São Pedro, como tinha
feito na abertura, mas,
desta vez, não entrou no templo. Paulo VI celebrou a
missa em latim na praça, ao vento da manhã de 8 de dezembro de 1965, festa da
Imaculada Conceição. Com a emoção no rosto de todos, do papa em primeiro lugar,
encerrava-se o Concílio Vaticano II.
No dia anterior, em Roma e Constantinopla ao mesmo
tempo, católicos e ortodoxos tinham “apagado da memória” as excomunhões de
1054, aquelas do grande cisma do Oriente. O ato removia o maior dos obstáculos
para uma futura reconciliação. Antes de partir de Roma, o metropolita Meliton, chefe
da delegação patriarcal, depositou nove rosas sobre o túmulo de Leão IX, em
cujo nome tinha sido emitida a excomunhão: nove rosas em memória de nove
séculos de separação.
O Concílio marcava um novo começo, sintetizado
notavelmente nos documentos conciliares. A Igreja, à luz da palavra de Deus,
celebrava os mistérios de Cristo para a salvação do mundo e, pela boca de Paulo
VI, podia finalmente dizer que ninguém lhe era estranho, ninguém estava
excluído, ninguém estava distante. “Também a vocês, homens que não nos
conhecem; homens que não nos entendem; homens que não nos consideram úteis,
necessários e amigos; e também a vocês, homens que, talvez pensando em fazer o
bem, nos contrariam: uma saudação sincera, uma saudação discreta, mas cheia de
esperança e, acreditem, cheia de estima e de amor”. Não era uma saudação de
despedida, mas de “amizade que permanece e que, se for o caso, quer nascer”,
para acender “uma nova centelha da divina caridade” e garantir que, na Igreja e
no mundo, possa realizar-se “a renovação do pensamento, das atividades, dos
costumes, da força moral e da alegria e da esperança, que foi a própria
finalidade do Concílio”.
Foram lidas, então, as “mensagens” ao mundo: aos
governantes, aos homens do pensamento e da ciência, aos artistas, às mulheres,
aos trabalhadores, aos pobres, aos doentes, aos que sofrem, aos jovens. Depois
de ler cada mensagem, o papa Montini entregava o texto aos representantes de
cada grupo abordado. Encerrou-se com a promessa de adesão e fidelidade ao
Concílio e com a esperança do advento da paz e do reino de Cristo. A última
bênção e a despedida de Paulo VI: “Ide em paz”. Eram 13h20 da tarde.
O Vaticano II tinha acabado e, naquele instante,
começava a sua jornada pelas estradas do mundo, portador de uma nova visão da Igreja.
Nova pelo destaque dado ao mistério diante das estruturas puramente
institucionais e legais. Nova pela ênfase na unidade do povo de Deus, colocado
intencionalmente antes da hierarquia, mais que na sua diversidade de funções e
obrigações. Nova porque a Igreja reconhecia ter sempre a necessidade de
purificar-se e renovar-se. Nova pela entrada de Roma no movimento ecumênico.
Nova pela abertura a um diálogo com o mundo contemporâneo, não visto mais como
um inimigo a priori. Uma Igreja, em suma, mais humilde, mais livre, confiante
não no próprio poder, mas no poder da palavra de Deus.
Uma Igreja que emergia dos “recintos sagrados” para
mostrar melhor a sua missão entre os homens. Uma Igreja redescoberta como Povo
de Deus, peregrinante. Uma Igreja a perscrutar os “sinais dos tempos”, os
momentos sempre novos da história humana, e, por isso, aberta, dinâmica,
criativa.
Hoje, cinquenta anos mais tarde, a nova imagem da
Igreja plasmada pelo Concílio é como se fosse sintetizada na “Igreja em saída”
do papa Francisco, a Igreja que deve ir às periferias geográficas, sociais,
existenciais. Humanas. Deve levar até lá a mensagem de Cristo para curar as
feridas e apoiar o direito sagrado de milhões de seres humanos a uma vida mais
digna. E deve, de lá, de um ponto de observação não condicionado pelo
excessivamente institucional e “hierárquico”, olhar para a sua própria
identidade, para a sua missão de evangelização.
Não é este o significado profundo de abrir o
Jubileu da Misericórdia em uma das periferias mais martirizadas do mundo de
hoje, a República Centro-Africana? De transformar Bangui na “capital espiritual
do mundo”? De testemunhar, numa terra devastada pela guerra civil, pela
oposição entre muçulmanos e cristãos, que, graças ao diálogo entre as
religiões, é possível conseguir a reconciliação e reconstruir juntos um futuro
melhor? De perguntar-se como Igreja, conforme o Concílio pediu há cinquenta
anos, se sobre o seu rosto brilha mais intensamente a imagem de Cristo?
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