Seg, 14 de Janeiro de 2013 12:39 por: cnbb
Dom Murilo S. R. Krieger
Arcebispo da Bahia
Arcebispo da Bahia
Os primeiros dias de um novo ano despertam
em nós uma série de perguntas: Como será este ano que começa? Conseguirei
superar os meus problemas? Haverá paz entre os povos? Os economistas
encontrarão respostas adequadas para os desafios que enfrentamos? Os
políticos... etc. Cada qual julga-se portador da solução ideal e do
remédio eficaz para os males que afligem nossa sociedade. Em meio a tanta
palavra vazia que se ouve, não seria o caso de buscarmos uma orientação nas
raízes de nossa fé? Não quero dizer com isso que as discussões sejam inúteis;
são, isto sim, normalmente incompletas. Falta-lhes, por vezes, um elemento
essencial: a convicção de que “Se o Senhor não construir a casa, é inútil o
cansaço dos pedreiros” (Salmo 127/126,1).
Por isso, deveríamos começar este
primeiro mês do ano da graça de 2013 com um profundo clamor, uma súplica
ardente, uma prece confiante. Explico-me, a partir de um texto do Deuteronômio.
Como é sabido, esse livro reproduz um grande discurso de despedida pronunciado
por Moisés, pouco antes de morrer, no fim da travessia do deserto e às vésperas
da conquista da Terra Prometida. Moisés apresentava as leis a serem observadas
na Terra Prometida, conclamando o povo a ser fiel à sua eleição e à aliança com
Deus. Depois de tomar os primeiros frutos de tudo o que a terra tivesse
produzido, e de tê-los colocado numa cesta, o fiel deveria apresentar-se ao
sacerdote, que colocaria a cesta diante do altar, e declarar, diante do Senhor:
“Meu pai era um arameu errante, que
desceu ao Egito com um punhado de gente e ali viveu como estrangeiro. Mas ele
tornou-se um povo grande, forte e numeroso. Então os egípcios nos maltrataram e
oprimiram, impondo-nos uma dura escravidão. Clamamos então ao Senhor, Deus de
nossos pais, e o Senhor ouviu nossa voz e viu nossa opressão, nossa fadiga e nossa
angústia; o Senhor nos tirou do Egito com mão forte...” (Dt 26,5-8).
Essa maneira de reagir diante dos
problemas (“Clamamos ao Senhor...”) tornou-se um gesto normal e frequente na
história do Povo Escolhido. Temos exemplos de súplicas em quase todos os livros
do Antigo Testamento. Ora é Salomão que se volta para o Senhor: “Ouve o clamor
e a oração que teu servidor te dirige” (2Cr 6,19), ora é o povo que brada:
“Olha e vê nossa ignomínia” (Lm 5,1), ou, então, são os profetas que, como
Daniel, insistem: “Ó nosso Deus, escuta as orações e as súplicas do teu servo”
(Dn 9,17). Também o salmista lança seu grito: “Salva-me, ó Deus, pois a água
sobe até o meu pescoço!” (Sl 69/68,1); “Inclina para mim teu ouvido; quando te
invoco, atende-me depressa!” (Sl 102/101,3) etc. Nessas súplicas, os que
clamavam partiam de uma convicção: o Senhor ama o seu povo, ouve sua oração,
gosta de lhe demonstrar sua amizade e atenção, e nunca deixa um grito ou pedido
sem resposta. Ele salva seus filhos e filhas porque é bom e poderoso.
Jesus procurou aprofundar em nós essa convicção, tanto que nos ensinou: “Pedi e
vos será dado. Pois todo aquele que pede, recebe” (Mt 7,7-8). Ele mesmo estava
atento aos pedidos que lhe faziam – como, por exemplo, no caso do cego: “Jesus,
Filho de Davi, tem compaixão de mim!” (Mc 10,47).
O grito que parte do coração da
criatura necessitada não se apóia nos méritos de quem o emite, mas na potência
do Senhor. Essa confiança não dá o direito de nos omitirmos, mas, ao contrário,
nos obriga a fazer a nossa parte e nos compromete ainda mais. Em outras
palavras: justamente porque, em nossas necessidades, nos voltamos para Deus,
com maior razão deveremos colocar nossos talentos na busca de soluções
concretas e eficazes para os desafios que enfrentarmos.
Comecemos, pois, o novo ano,
apresentando ao Senhor nossa própria dor, o sofrimento de nossa família ou
comunidade, e os grandes problemas de nosso país. Nosso Deus abrirá diante de
nós, então, novos caminhos, ao mesmo tempo em que nos dará força para fazermos o
que nos compete. Sim, o Senhor ouvirá nossa voz e virá ao nosso encontro,
porque é Deus, porque é Pai, porque é amor.
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